Foto: Júlia Rodrigues / Divulgação
Crescer dói. A responsabilidade pesa. Junte-se a isso mudanças tecnológicas constantes, transformações na forma de comunicação e clima político polarizado. Temos a receita perfeita para adultos ansiosos, depressivos e isolados.
Sou fruto da geração que se acostumou a chamar de X, os millennials. Nos últimos anos li muitos artigos e notícias sobre como minha geração estava mudando o mundo e destruindo muitas coisas. Não importa a geração, imagino que sempre deve ter sido difícil ser um adulto nesse mundão.
Mas calma, vamos respirar um momento (conselho do Emicida) e pensar um pouco sobre essa coisa de ser adulto?
A culpa é dos millennials
Fomos acusados de acabar com a maionese, não comprar guardanapos nem giletes e gastar demais com avocado toasts. A lista de indústrias que os millenials supostamente “mataram” ou deixaram em maus lençóis é enorme e inclui amaciantes, refrigerantes e até o golfe.
Vimos um número gigante de tecnologias nascerem, algumas se transformando em essenciais (como a gente vivia sem isso antes?) e outras morrendo (blue-ray, o que é isso?).
Também somos a geração que buscou e ainda busca por propósito e realização pessoal no trabalho. Que foi atrás de equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Que está muito longe de comprar um imóvel, inventou a economia compartilhada, que demora para casar e tem filhos mais tarde.
Imagino que uma nova geração entrando na maioridade sempre gere impactos e irrite a galera que veio antes. Essa foi a primeira vez que presenciei isso acontecendo. Fato é que os adultos atuais valorizam coisas diferentes que seus pais e avós. São fruto de um momento histórico diferente e cresceram com outras possibilidades no horizonte.
Apesar da melhoria da qualidade de vida nas últimas décadas em muitos lugares do mundo (não em todos e não igualmente, que fique claro), a sensação é que nunca foi tão difícil ser um adulto no planeta Terra.
O que posso dizer da minha experiência como uma adulta imersa em redes sociais, fake news, startups unicórnio e a uberização do mercado de trabalho? É tanta coisa que nem comecei a formular ainda. Só sei que não está sendo fácil.
Mas também não é o fim do mundo.
Pense: E o quanto vida vale? Seja luz nesse dia cinzento
Em “Pequenas Alegrias da Vida Adulta”, música na qual essa reflexão foi inspirada, Emicida reconhece a dificuldade de ser adulto nos nossos tempos, mas também aponta muitas coisas positivas. O olhar dele vai para os detalhes do dia a dia, o que me tocou profundamente.
Por que não reajustar a perspectiva e escolher focar nas pequenas coisas boas? Pode parecer clichê. Mas, em sua música, Emicida é tudo mesmo clichê ao destacar os pequenos momentos de felicidade em uma vida adulta:
“É um sábado de paz onde se dorme mais
O gol da virada quase que nóis rebaixa
Emendar um feriado nesses litorais
Encontrar uma tupperware que a tampa ainda encaixa (ó Glória)
Mais cedo brotou alecrim e uns segredo
‘Tava com jeito que ia dar capim
Ela reclama do azedo, recolhe os brinquedos
Triunfo hoje pra mim é o azul no boletim
Uma boa promoção de fraldas nessas drogarias
O faz me rir na hora extra vinda do serviço
Presentes feitos com guache e crepom lembra meu dia
Penso que os sonhos de Deus deve ser tipo isso”
(As pequenas alegrias da vida adulta, Emicida, part. Thiago Ventura e Marcos Valle)
É mundano, é pequeno, mas são desses momentos que uma vida humana é feita. Por que a gente age como se fosse pouco?
Minha alma disse: “demorô”
Nosso cérebro está sempre nos direcionando para preocupações futuras. Insiste em nos fazer acreditar que a alegria e felicidade estão nos grandes momentos, nos casamentos, promoções e compras de casa própria.
Mas, sejamos sinceros, se só os grandes momentos valem a pena, vamos viver 99% do tempo esperando por esse 1%. Não me parece justo. Ou inteligente de nossa parte.
Os marcos de uma vida são raros, por isso são marcantes. São a convergência de anos de esforço, ou de vulnerabilidade para se relacionar com as pessoas, ou de muito trabalho interno. Se a gente for viver pagando os boletos, pegando os ônibus e dando valor apenas para esses grandes momentos, vai ficar difícil mesmo.
Sem contar que, me desculpem as crianças e adolescentes, mas essas fases também são complicadas. Penso que nem tudo era flores. O que dizer da falta de liberdade? A dificuldade de se relacionar sem saber ainda quem realmente somos? As dúvidas e falta de autoconfiança?
Por isso, busco olhar para essas pequenas alegrias do dia a dia. Uma peça de teatro que tenho a oportunidade de ver (coisa que jamais aconteceria quando era mais nova). A janta que preparo, que fica parecida com a comida da minha mãe. A possibilidade de pensar e escolher meu estilo de vestir.
É uma escolha de perspectiva, que nem sempre é fácil de ser feita. Tem muito a ver com os conceitos de viver o presente, atenção plena e mindfulness. Gostar de meditar e ler uns livros de autoajuda? Também é coisa de millennial, mas que faz sentido, faz. Pelo menos para mim.
Indico muito escutar a música e todo o álbum AmarElo, do Emicida.
Para uma análise linda de “Pequenas Alegrias da Vida Adulta”, incluindo o próprio Emicida, não deixe de escutar o episódio #222 do podcast Mamilos, de Juliana Wallauer e Cris Bartes.
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